O grande problema para os investidores: desta vez, Trump pode não se importar com quedas do mercado

Tracker - Valeriia Polishchuk

Durante o seu primeiro mandato na Casa Branca, o residente Donald Trump esteve totalmente focado no mercado de ações em ascensão. Até os marcos mais banais do mercado eram celebrados. E, se os investidores não gostassem das suas políticas, ele recuava.

Agora, parece que o guião mudou na era Trump 2.0.

Os ganhos pós-eleitorais desapareceram rapidamente. As ações nos EUA caíram. A confiança na agenda económica de Trump desmoronou e a frustração com o caos da guerra comercial aumentou.

“O mercado está a dar um sinal negativo às políticas de Trump. Para os investidores, não é de todo óbvio que tudo isto levará a uma era dourada”, afirma Ed Yardeni, veterano de Wall Street e presidente da Yardeni Research.

Ainda assim, Trump, pelo menos até agora, não recuou.

A sua estratégia de aumentar drasticamente as tarifas alfandegárias continua em andamento, tal como o plano para cortar os gastos do governo e despedir em massa trabalhadores federais. Os responsáveis da administração Trump ignoraram, em grande parte, a rápida correção de 10% no índice S&P 500.

Os investidores chegaram a uma conclusão preocupante: desta vez, Trump pode estar muito mais disposto a tolerar quedas do mercado.

“Trump não parece importar-se com o que o mercado de ações está a fazer”, diz Ed Yardeni, acrescentando que isso representa um problema para os investidores, que começam a perceber que Trump pode não estar a blefar em relação às tarifas.

Durante o primeiro mandato de Trump, os investidores assumiam a existência de um “Trump Put” – a ideia de que, se os mercados caíssem abaixo de um determinado nível, a Casa Branca mudaria de rumo para recuperar as ações. Essa possibilidade limitava as perdas do mercado.

“Hoje, não há ‘Trump Put’. Pelo contrário: parece que as políticas de Trump estão a enfraquecer potencialmente a economia”, afirma Yardeni.

"Não temos confiança"

Na última semana, a Reserva Federal reduziu a previsão de crescimento económico para 2025, alertando para uma inflação mais elevada e um mercado de trabalho mais enfraquecido.

Keith Lerner, estratega-chefe de mercado da Truist Advisory Services, diz que os investidores estão incertos quanto à atual agenda de Trump, que inclui tarifas muito altas, desregulamentação e preços baixos do petróleo.

“Está a acontecer uma experiência. E não temos confiança em como isto vai resultar”, afirma Keith Lerner.

Claro que os presidentes não devem tomar todas as suas decisões com base no mercado financeiro. O que é bom para Wall Street nem sempre é bom para a economia real.

Além disso, o mercado de ações é notoriamente volátil. Muitas vezes, os investidores concentram-se em ganhos de curto prazo, ignorando questões mais profundas. (Veja-se, por exemplo, as ocasiões em que o mercado desvaloriza, após um relatório sobre o emprego forte, e vice-versa).

Além do mais, a esmagadora maioria das ações está nas mãos de famílias ricas, o que significa que um mercado de ações em alta pode agravar ainda mais a desigualdade de riqueza.

Com os mercados a cair, a administração Trump mantém-se indiferente

Os responsáveis da administração Trump descrevem a atual instabilidade do mercado como um sofrimento temporário, em troca de ganhos a longo prazo.

“Não estou preocupado com os mercados. A longo prazo, se implementarmos uma boa política fiscal, desregulamentação e segurança energética, os mercados irão prosperar”, afirmou o secretário do Tesouro, Scott Bessent, ao programa Meet the Press, da NBC News, este mês.

Scott Bessent chegou mesmo a descrever as correções do mercado como “saudáveis” e “normais”, especialmente em comparação com um mercado que sobe “sempre em linha reta”.

E, em grande parte, ele tem razão. Correções no mercado acontecem ocasionalmente. E é preferível que os mercados sobreaquecidos arrefeçam gradualmente do que colapsem de repente.

O contraste marcante entre Trump 1.0 e 2.0

Os mercados dispararam após a vitória de Trump, em novembro de 2016, e essa tendência continuou, pois inicialmente ele concentrou-se sobretudo em questões pró-negócios.

As tarifas alfandegárias só chegaram em 2018, depois de Trump já ter aprovado cortes massivos de impostos para as empresas. O S&P 500 não teve um mês de perdas significativo até fevereiro de 2018.

O ‘Dia da Libertação’ aproxima-se

No segundo mandato, Trump tem-se focado na redução drástica dos gastos públicos, em deportações em massa e em tarifas alfandegárias elevadas, que, segundo responsáveis da Reserva Federal, poderão agravar ainda mais a inflação.

Os investidores temem que estas taxas de importação mantenham as taxas de juro elevadas por mais tempo, arrefeçam o investimento empresarial e reduzam os lucros. Em março, o S&P 500 caminha para o seu terceiro mês consecutivo de perdas nos últimos quatro meses.

Os cortes de impostos podem acontecer – mas ainda não aconteceram.

Primeiro, vem o Dia da Libertação.

Esse é o nome que Trump deu ao dia 2 de abril, data em que prometeu avançar com o seu plano de tarifas recíprocas sobre os parceiros comerciais dos EUA.

A incerteza sobre os detalhes dessas tarifas é muito elevada. E essa incerteza está a aumentar a volatilidade dos mercados.

Trump disse aos jornalistas na sexta-feira que haverá “flexibilidade” nas tarifas recíprocas, sem esclarecer o que isso significa na prática.

“Chamar-lhe Dia da Libertação não me dá uma sensação muito reconfortante”, admite Ed Yardeni.

Uma birra no mercado

Alguns investidores receiam que Trump não esteja a ouvir a mensagem que lhe estão a enviar. E isso pode agravar ainda mais a reação dos mercados.

Nos anos 1990, Ed Yardeni cunhou o termo bond vigilantes para descrever investidores do mercado obrigacionista que protestavam contra más políticas de Washington, vendendo dívida dos EUA.

Agora, Yardeni vê uma situação semelhante a acontecer no mercado de ações.

“Se os vigilantes do mercado de ações de hoje sentirem que os seus avisos sobre o risco de recessão não estão a ser ouvidos, poderemos ver uma liquidação ainda maior, enquanto tentam chamar a atenção de Washington”, diz.

É semelhante a uma criança que grita ainda mais alto depois de não conseguir o que quer durante uma birra. Mas, neste caso, essa "birra" pode ter um impacto real na economia.

Quanto mais os mercados caírem, maior será a probabilidade de empresas e consumidores – especialmente famílias de rendimentos elevados – reduzirem os seus gastos, afetando os lucros das empresas e levando a novas quedas nas ações.

No entanto, os responsáveis da administração Trump demonstraram uma “disposição para tolerar a instabilidade no mercado de ações”, constata Keith Lerner, estratega da Truist Advisory Services.

“Todos estão a tentar perceber: em que ponto é que eles vão começar a importar-se?”, diz Lerner.

Fonte: CNN Portugal, 30 de março de 2025

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