A tragédia e o milagre
Beyond
Paradise – Kris Marshall, Zahra Ahmadi, Jade Harrison
Enquanto
as nações europeias caminham em direção à tragédia, Milei vai protagonizando um
milagre na Argentina
As instituições, bem como a sua qualidade, são um imperativo
para qualquer nação que se queira desenvolvida e próspera. Foram precisamente os estudos que desembocaram nesta
conclusão que conduziram Daren Acemoglu, James Robinson e Simon Johnson ao
prémio Nobel da Economia em 2024. O reconhecimento vem reforçar a
importância do papel que a História Económica – uma ciência cada vez mais posta
de lado nos departamentos de Economia – representa no exercício sempre complexo
de tentar descortinar os problemas presentes e futuros. Já em 1993, Douglass North havia sido galardoado por
investigações de cariz semelhante.
Ainda a este respeito, o historiador escocês Niall Ferguson assinou um
livro intitulado The Great Degeneration: How Institutions Decay and
Economies Die, publicado em 2013, no qual se dedicou, como o nome sugere,
ao impacto das instituições nas economias. A diferença entre o trabalho de
Ferguson e o dos outros autores antes mencionados reside no facto de que o
escocês se focou em como a degradação institucional no Ocidente está a destruir
as economias desenvolvidas, ao passo que os outros autores investigaram
principalmente como as instituições extrativistas estão a impedir o progresso
de países em desenvolvimento.
No final do primeiro capítulo, o historiador brinda-nos com uma passagem que, não
fosse ela mais ou menos previsível para quem analisa de forma rigorosa a
História, poderia entrar para o leque das profecias. Depois de identificar a
política fiscal dos governos ocidentais como a causa principal da destruição do
contrato social entre gerações teorizado por Burke, e de constatar que ir
adiando uma urgente «reforma global das finanças públicas» levar-nos-ia a uma
situação degradante, Ferguson escreveu o seguinte: «As
democracias ocidentais vão continuar na sua atual forma negligente até que, uma
após outra, sigam a Grécia (…) na espiral de morte fiscal que (…) termina
quando os governos são forçados a impor cortes na despesa e impostos mais
elevados no pior momento possível». Soa familiar?
França
já caiu, com o primeiro-ministro François Bayrou a anunciar medidas de
austeridade para evitar uma tragédia grega. O Reino Unido será o próximo, sendo que, segundo uma
manchete do The Independent, «Rachel
Reeves [chanceler do Tesouro] enfrenta um ‘trilema impossível’ e tem de
aumentar os impostos ou reduzir a despesa para tapar o buraco negro do 50 mil
milhões de libras».
Esta situação levar-nos-á, avisava Ferguson, a uma
«combinação de incumprimento e inflação». Mas talvez a frase mais interessante
do intelectual escocês seja a que utilizou para rematar esta passagem que se
revela cada vez mais certeira: «Todos
acabamos como a Argentina».
Agora, em agosto de 2025, assistimos, de facto, à marcha
dolorosa das democracias ocidentais em direção a um estado estacionário, como
caracterizado por Adam Smith, que poderá bem chegar a tornar-se catastrófico
tal como acabou por se tornar o caso argentino. Mas quando olhamos hoje para
Buenos Aires podemos identificar a tendência inversa. Um Estado falhado, fruto
do descalabro patrocinado por Perón e pelos seus descendentes políticos, é agora um «milagre manmade de Milei», como
escreveu o mesmo Niall Ferguson há duas semanas. Assim, se a Europa segue um
caminho cujo destino é uma tragédia institucional e fiscal praticamente
inevitável, a Argentina renasce das cinzas
para se tornar aquilo que já foi no passado: uma potência económica na
vanguarda da liberdade. De forma curta, um verdadeiro milagre.
E, a avaliar pelo seu estado atual, apenas um milagre poderá reverter a
situação europeia
Gonçalo Nabeiro
Fonte: Sol, 13 de agosto de 2025
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