Guerra deixa economia russa à beira do colapso
Perry Mason
(1957-1966) – Adam West, Josephine Hutchinson, Enid Jaynes
Gastos
com a defesa representam 32% do total das despesas do orçamento de 2025. São
mais de 130 mil milhões de euros, cujo custo em espiral da guerra traz uma dor
económica crescente para a Rússia, a somar à escassez de mão de obra. Tudo isto
asfixia a economia
Numa altura em que as sanções contra a Rússia estão no topo
da agenda da União Europeia – que prepara o 19.º pacote – e já estiveram (mas
não se sabe se ainda estão) na dos Estados Unidos, a
economia russa continua a apresentar sinais de resiliência que, podendo
esconder males maiores que por aí veem, tem deixado os analistas económicos
surpreendidos.
O crescimento é evidentemente impulsionado pelos gastos
militares, mas pela substituição de parceiros comerciais ocidentais por outros,
como a China e a Índia – que têm sustentado o esforço de guerra. Mas esta é
também uma caraterística que, a médio prazo, será perniciosa para a economia
russa: o comércio com aqueles parceiros tem como base o petróleo bruto (cada
vez mais importante em consequência dos ataques ucranianos às refinarias
russas), os combustíveis e os seus derivados, que são vendidos a preço de
saldo. A União Europeia não tem direito a este
desconto de ‘amizade’ – o que
implica uma situação complexa: o bloco ainda não deixou de comprar petróleo
russo, contribuindo ainda mais para o financiamento da guerra, uma vez que não
tem descontos.
Por outro lado, a Rússia enfrenta desafios significativos:
inflação elevada, escassez de mão de obra – desviada para o esforço de guerra e
o risco de estagnação a longo prazo devido ao foco no setor militar, à falta de
investimento em setores civis e ao acesso reduzido à tecnologia ocidental. A
inflação afetou o poder de compra e forçou o Banco Central da Rússia a aumentar
as taxas de juros para um nível que desencoraja o investimento privado e
dificulta o crescimento do setor não militar.
Os setores automóvel, da construção e a siderurgia são,
segundo os analistas, dos mais afetados. Além disso, o investimento estrangeiro
desapareceu – e se isso, num primeiro momento depois do início da guerra, foi
um fator positivo, dado que as empresas estrangeiras trataram de sair da Rússia
a qualquer preço (sempre baixo), a inflação e o encolhimento do mercado interno
deu cabo de negócios que pareciam aliciantes.
As sanções fazem, entretanto,
o seu papel. São evidentemente um obstáculo à transferência de
tecnologia – impedindo a modernização da economia – capturaram os investimentos
e depósitos mantidos pelos investidores russos fora das fronteiras, retiraram
mercado às exportações e induziram uma acentuada míngua de divisas.
Para os analistas, as perspetivas a
longo prazo são desfavoráveis: os especialistas adiantam um cenário
de crescimento potencial mais lento e uma grande dificuldade em recuperar os
níveis de rendimento pré-guerra.
Segundo o Trading Economics, o PIB russo expandiu 4,1% em
2024, a mesma taxa do ano anterior, com suporte do aumento dos gastos e do
investimento no setor militar.
A Rússia aumentou os gastos estatais com a defesa nacional
em um quarto, em 2025, para 6,3% do PIB, o nível mais alto desde a Guerra Fria.
Os gastos com a defesa representam 32% do total das despesas do orçamento de
2025. Qualquer coisa como mais de 130 mil milhões de euros, cujo custo em
espiral da guerra traz uma dor económica crescente para a Rússia.
O crescimento do PIB deverá atingir 1,5% no final de 2025 e
não deverá ir além dos 1,2% no ano seguinte. Mas com o primeiro trimestre do
ano em plena contração (o PIB contraiu 3,1% na base anualizada e 0,6% na
trimestral), embora a previsão ainda seja positiva, tudo indica que a economia
está a desacelerar rapidamente, numa altura em que a inflação atingiu os 8,8%
em julho passado. Um dado que vale a pena reter:
entre fevereiro de 2020, data da invasão da Ucrânia, e julho de 2025, a Rússia
acumulou 915 mil milhões de dólares com a venda de petróleo, gás e carvão.
Mas as exportações de petróleo, gás e minerais já não são
tábua de salvação suficiente. A escassez de mão de obra e as elevadas taxas de
juro para combater a inflação, acelerada num contexto de despesas militares sem
precedentes, estão a asfixiar as perspetivas económicas.
Reversão geopolítica
O governo russo tem, porém, tentado convencer os russos e o
Ocidente de que a resistência da sua economia é, a todos os títulos, notável.
No entanto, vai deixando evidências de que
Vladimir Putin já percebeu que não pode continuar a arrastar uma economia de guerra.
Aparentemente, a medida mais perene será a de insistir no desenvolvimento das
relações económicas com a China, desde logo, mas com outros países que estão
disponíveis para isso.
Esta semana, na cimeira da Organização de Cooperação de
Xangai (OCX), foi dado um sinal de viragem: uma nova ordem mundial da China
ganha força com Rússia e Índia, após a escalada de tarifas impostas por Trump,
que ameaça com taxas de 50% sobre produtos indianos em resposta à compra de
petróleo russo pela Índia.
Xi Jinping defende o
multilateralismo contra tarifas dos EUA, propondo ampliar espaço
para a cooperação asiática ganhar peso institucional, com reflexos diretos nas
cadeias de energia e no comércio internacional. Putin apoia a nova ordem
mundial da China e o interesse de novos países em aderir à organização mostra o
potencial do bloco como alternativa às estruturas dominadas pelo Ocidente.
Fonte: O Jornal Económico, 6 de setembro de 2025
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