Olena Semenyaka, a "Primeira-Dama" do nacionalismo ucraniano
Publicado originalmente em outubro de 2020, decidimos
traduzir o texto de Adrien Nonjon, professor francês ligado a organizações
neonazis ucranianas, publicado no programa "Illiberalism", da
Escola Elliott de Relações Internacionais da Universidade George Washington.
Este texto é ideal para compreender as ligações entre organizações, pessoas e
ideias que circulam tanto na Europa como na própria Ucrânia. Este texto é de
particular interesse, dada a discussão atual sobre o processo de
"desnazificação" empreendido pela Federação Russa na Ucrânia,
enquanto os meios de comunicação social questionam e negam a existência de
grupos extremistas.
Durante anos, movimentos nacionalistas ucranianos como o
Svoboda (Свобода) ou o
Setor Direito (Пра́вий се́ктор) promoveram um nacionalismo
introspetivo e centrado no Estado, herdado da Organização dos Nacionalistas
Ucranianos do início da década de 1930 e amplamente dominado pelas visões do
mundo nacionalistas ucranianas ocidentais e galegas [da Galícia, região da
Europa Oriental. Não confundir com a Galiza, comunidade autónoma do noroeste de
Espanha]. A revolução EuroMaidan, a anexação da Crimeia pela Rússia e a guerra
no Donbass alteraram o paradigma do nacionalismo ucraniano, dando origem ao
movimento Azov (Азов).
O Corpo Nacional de Azov, liderado por Andriy Biletsky, foi estabelecido a 16
de outubro de 2014, com base no Regimento Azov, agora parte da Guarda Nacional
da Ucrânia. O Corpo Nacional de Azov é atualmente um partido nacionalista com
cerca de 10 000 membros e que se expande na sociedade ucraniana através de
diversas iniciativas, como campos de treino patriótico para crianças (Azovets)
e grupos de milícias. O Azov pode ser descrito como um movimento
neonacionalista, em sintonia com as atuais transformações da extrema-direita
europeia: recusa-se a ficar preso a mitos antiquados obcecados por uma relação
colonial com a Rússia e vê-se como uma visão externa em que o seu quadro
intelectual vai além do território da Ucrânia, envolvendo deliberadamente
estratégias pan-europeias.
Olena Semenyaka (n. 1987) é a líder do movimento Azov: desde
2018 tem sido secretária internacional do Corpo Nacional (e líder de facto
desde a fundação do partido em 2016), ao mesmo tempo que dirigia a editora e o
clube metapolítico Пломінь (Plomin, “chama”). Ganhando visibilidade à medida
que o regimento Azov se transformava num movimento multifacetado, Semenyaka
tornou-se uma importante teórica nacionalista na Ucrânia. A “primeira-dama” do
nacionalismo ucraniano deslocou o movimento para uma dimensão regional que
abarca tanto a Europa de Leste como o continente em geral, reativando o velho
mito geopolítico do Intermarium (a). Procurou também descompartimentar o
movimento Azov, permitindo-lhe consolidar associações frutíferas com outros
movimentos nacionalistas europeus através de projetos de que é a principal
arquiteta: “Reconquista-Pan Europa” e o “Pacto de Aço”. Por último, mas não
menos importante, tem trabalhado para forjar laços políticos suficientemente
amplos para garantir que o movimento Azov vá para além da mera ação militar.
A crescente influência e os laços internacionais de Semenyaka fazem dela uma importante contribuidora intelectual para o novo cenário identitário pan-europeu, semelhante aos mais mediáticos na Rússia, Aleksandr Dugin, ou Steve Bannon nos Estados Unidos. No segundo semestre de 2019, esteve no centro das atenções dos média do consórcio britânico de jornalismo de investigação Bellingcat, que a acusou de promover uma Internacional de extrema-direita (Kuzmenko, 2019). De facto, ela tenta impor a sua ideologia aos debates metapolíticos ocidentais, despertando com sucesso o interesse pela sua visão conservadora e revolucionária da geopolítica europeia.
Aleksandr Dugin e Olena Semenyaka
Do estudo do tradicionalismo à "Primeira
Dama" do Nacionalismo Ucraniano: Uma trajetória
Pouco se sabe sobre Semenyaka e os seus antecedentes antes
da revolução ucraniana de 2014. Nasceu em 1987, numa família modesta e bilingue
(ucraniano e russo), e descreve-se a si própria como historiadora da filosofia
de formação (Semenyaka, 2019a). Semenyaka possui um mestrado em Filosofia, com
especialização na Revolução Conservadora Alemã. Desde 2010, preparava um
doutoramento no Departamento de Filosofia e Estudos Religiosos da Academia
Mohyla da Universidade Nacional de Kiev (interrompido pela revolução do Maidán
de 2013-14), centrado na hermenêutica da metahistória de Ernst Jünger, incluindo o seu diálogo com Martin Heidegger –
duas figuras filosóficas e conservadoras alemãs que moldaram o seu pensamento
atual, como veremos mais adiante. Os seus antigos professores descrevem-na como
uma estudante brilhante, reservada e introvertida, mas dedicada ao seu
trabalho.
Ingressou no Clube Tradicionalista Ucraniano (Ukraïns’kii
Traditsionalistichnii Klub, UTK), fundado em 2010 pelo jovem analista
geopolítico Andriy Voloshyn, contando com o apoio dos seus professores, Serhiy
Kapranov e Yurii Zavhorodnii. Enquanto participante no projeto político e
cultural “Politosophia”, lançado pelo seu colega Sviatoslav Vyshynsky e
destinado a difundir os temas da revolução conservadora e do tradicionalismo
entre a juventude estudantil ucraniana, Semenyaka publicou vários estudos no Almanaque
Internacional da Tradição e da Revolução (Mezhdunarodnyi al’manakh Traditsii i
Revoliutsii) e na revista do departamento da Academia Kyiv-Mohyla. [Olena
Semenyaka. (2011). “Novyj nacionalizm” Ernsta Yungera yak metafizychnyj kodeks
“novoho lyuds”koho typu” [o “Novo Nacionalismo” de Ernst Jünger como código
metafísico do “novo tipo humano”], Naukovi zapysky NaUKMA. Filosofiya ta
relihiyeznavstvo, 115, pp. 41-44].
Semenyaka ganhou destaque no seio do movimento
tradicionalista duginiano com o seu artigo “A Revolução Conservadora como
Modernismo Mitológico”, publicado no Volume IV da antologia de Aleksandr Dugin,
Em busca do Logos Sombrio. Foi convidada para falar na conferência
internacional Contra o Mundo Pós-moderno, organizada na Universidade Estatal de
Moscovo Lomonosov em 2011 pelo Centro de Tradição, presidido por Dugin.
Distanciando-se das questões ucranianas e crítico do discurso autonomista da
filial ucraniana da União da Juventude Euro-Asiática com sede em Sebastopol, na
Crimeia, Dugin esperava abrir novas formas de cooperação entre a Rússia e a sua
periferia ocidental através de Olena Semenyaka, em linha com a sua visão
neo-eurasianista. Para além de se reunir com Dugin, Semenyaka conviveu com
pensadores reacionários e tradicionalistas que discursaram nos vários painéis,
entre os quais os franceses Laurent James e Christian Bouchet, do movimento da
Terceira Via, bem como o xeque Abdulvahid Pallavicini, presidente da Comunidade
Religiosa Islâmica Italiana e fundador do Centro Italiano de Estudos
Metafísicos.
A súbita eclosão da revolução de Maidán, em novembro de
2013, foi o ponto de viragem no ativismo de Olena Semenyaka. Participando nos
protestos de rua, como muitos estudantes, foi agredida pela polícia e, após
fugir ao avanço das forças repressivas na rua Bankova, Semenyaka e muitos
outros ativistas nacionalistas aperceberam-se da natureza histórica da revolta.
A queda do presidente Viktor Yanukovich não só redefiniu os horizontes das
aspirações nacionais ucranianas e transformou o Ocidente numa fonte de polarização
aberta, como também a violência sem precedentes da revolução e a escala da
mobilização remodelaram o panorama político ucraniano. Novas estruturas
políticas emergiram, abrindo efetivamente um período de incerteza política que
os nacionalistas ucranianos, anteriormente marginalizados e agora protagonistas
da revolução, “souberam aproveitar”. Como declarou Semenyaka:
“Embora tenha sido um derrube em vez de uma Revolução
Nacional consumada, o espírito desta última despertou, e a consolidação
patriótica massiva no nosso país, sem mencionar a ascensão da direita
ucraniana, surpreende-nos ainda mais do que esta vitória milagrosa.”
Semenyaka decidiu envolver-se na política após o rebentar do
conflito russo-ucraniano na primavera de 2014. Esse compromisso pôs fim, de
forma definitiva, aos seus laços com Dugin, que se posicionara na vanguarda das
ambições imperiais russas na Crimeia e na Novoróssia. Dugin retomou os seus
argumentos anti-ucranianos, que desenvolvera após a Revolução Laranja, na sua Quarta
Teoria Política, onde considerava a Ucrânia como uma “nação inexistente” ou
um “acidente da história”, condenando assim a Revolução de Maidán e a sua
suposta orientação pelas “forças atlantistas”.
Ao cortar os laços com os círculos neo-eurasiáticos
rusófilos, Semenyaka juntou-se ao Práviy séctor (Пра́вий се́ктор), uma
plataforma política e militar que procurava unir diversos movimentos
nacionalistas ucranianos. No seu papel de secretária de imprensa do movimento,
começou a internacionalizar a causa ucraniana num momento em que a
extrema-direita europeia não escondia o seu apoio à perspetiva russa sobre o
conflito.
“[...] apesar de ter assumido a responsabilidade pelas
relações do Sector Direito com movimentos e organizações nacionalistas
estrangeiras, estabeleci um objetivo mais complexo que requer, de facto,
pensamento estratégico. Assim, as atualizações periódicas nas redes sociais,
que informam os nossos apoiantes (e inimigos) sobre o progresso da direita
ucraniana e dos patriotas em geral, assim como as entrevistas, que servem
principalmente para dissipar os mitos da propaganda tanto do Kremlin como do
Ocidente, não são um fim em si mesmas e só se tornaram a minha principal
preocupação após o rebentar da guerra de informação sobre a Ucrânia e sobre o
Sector Direito em particular [...]. Como resultado, em vez de responder a todos
e estabelecer ligações com organizações de direita formalmente ‘neutras’ ou
abertamente pró-russas, posso ser bastante pouco diplomática enquanto
‘Secretária de Imprensa’. [...] De facto, escolhi o papel de defensora do
Sector Direito tanto dentro como fora do nosso país. O apoio informativo ao
Sector Direito também era necessário como parte da promoção da Terceira Via
entre os ucranianos comuns, que inicialmente tinham expectativas demasiado
elevadas em relação ao Ocidente.”
No entanto, Semenyaka e o Sector Direito acabariam por
divergir. Dois fatores afastaram gradualmente, mas de forma inexorável,
Semenyaka do movimento: as diferentes agendas com o líder do movimento, Dmytro
Yarosh, e o fracasso eleitoral do Sector Direito nas eleições parlamentares de
maio de 2014, em que o movimento obteve apenas 0,7% dos votos. A separação
concretizou-se em 2015, quando Semenyaka se juntou à unidade da Guarda Nacional
Ucraniana do regimento Azov para prosseguir as suas atividades.
Esta decisão não foi apenas um exemplo de oportunismo; foi
antes motivada por ideologia e ambições partilhadas: a guerra é omnipresente no
discurso político do movimento Azov. Baseando-se no ideal militar dos autores
revolucionários conservadores alemães, como Ernst Jünger e Ernst von Salomon, a
guerra é também uma referência constante para Semenyaka: a guerra justifica a
necessidade de desenhar uma nova forma de sociedade, onde os interesses e a
proteção do povo sejam prioridades absolutas.
Ao contrário do Sector Direito, que era um agregado de
movimentos díspares e frequentemente concorrentes, o Regimento Azov possui uma
estrutura de poder vertical muito forte, personificada pelo seu líder
carismático, Andriy Biletsky. Graças aos seus extensos recursos financeiros
provenientes de vários "senhores da guerra" nacionalistas (Yavir,
2016) — e à sua integração na Guarda Nacional da Ucrânia, liderada pelo ministro
do Interior Arsen Avakov, em maio de 2014 — o Regimento Azov conseguiu instigar
inúmeras iniciativas para entrar na arena política ucraniana ao verdadeiro
estilo gramsciano: uma estratégia em que a batalha política deve ser travada
sobretudo no campo cultural. O Azov tornou-se ainda mais popular do que o Setor
Direito graças às suas vitórias na "zona de operações
antiterroristas" em Mariupol e Shyrokyne em março de 2015 e ao seu
envolvimento em ativismo antirrusso e anticorrupção (Nonjon, 2017). O seu objetivo
é utilizar a sua aura para gerar nova legitimidade e liderança política para o
nacionalismo ucraniano.
Semenyaka sentia-se naturalmente à vontade com a ideologia pan-europeia de Azov. A sua formação intelectual em filosofia política, o seu carisma e a sua capacidade de se afirmar fizeram dela uma figura central e uma importante interlocutora na estratégia política de Azov. Anteriormente secretária de imprensa do Corpo Cívico de Azov, participou na formação do partido político Corpo Nacional em outubro de 2016. Ao mesmo tempo, projetou as bases de dois novos projetos geopolíticos, nomeadamente "Intermarium" e "Reconquista-Pan Europa" (por vezes simplesmente "Reconquista"), com o objetivo de ancorar a causa ucraniana numa nova metageopolítica europeia.
Ela levou então o aspeto metapolítico do seu compromisso a
um novo patamar dentro do Clube Plomin (Clube Flama), fundado por vários
antigos alunos da Academia Mohyla da Universidade Nacional de Kiev. Dentro
desta nova estrutura intelectual, ela procurou sobretudo apresentar os
pensadores europeus de extrema-direita à jovem guarda nacionalista ucraniana.
No âmbito deste projeto ecuménico, desempenhou um papel ativo, de 2017 a 2019,
na tradução e publicação para ucraniano de "Fogo e sangue", de
Ernst Jünger, para o qual escreveu um prefácio, e de "Um samurai
ocidental, para uma crítica positiva, o coração rebelde” de Dominique
Venner. Além disso, para o projeto Reconquista-Pan Europa, editou uma coletânea
de "Materiais da Reconquista" (2015-16) em inglês e concluiu
uma antologia bilingue inglês-ucraniana sobre o nacionalismo europeu, com
textos de autores como Mircea Eliade, Hans Freyer, Julius Evola e Arthur
Moeller van den Bruck, além de Dmytro Dontsov (1883-1973), o pai do nacionalismo
autoritário ucraniano contemporâneo.
Para além destas atividades editoriais, Semenyaka afirmou-se
como mediadora de poder para o "Manifesto Nacional" de Azov,
de 2017, que estabeleceu uma aliança entre partidos nacionalistas para as
eleições presidenciais e legislativas de abril a junho de 2019. A sua ascensão
política como embaixadora zelosa do nacionalismo ucraniano foi repentina,
quando ingressou no gabinete político do Corpo Nacional em 2019 como secretária
internacional do movimento. A partir de abril de 2019, foi responsável pela
coordenação de redes transnacionais, realizando diversas reuniões com a
extrema-direita europeia e participando em conferências e encontros na
Alemanha, Finlândia e Croácia com o Partido Nacional Democrático da Alemanha
(NPD), os Socialistas Nacional-Revolucionários Alemães, os jovens tradicionalistas
polacos, os neopagãos finlandeses e os supremacistas brancos americanos que
aspiravam a "reconectar-se com as raízes ideológicas europeias".
Desde o final de 2019, tem vindo também a trabalhar num novo protótipo de um
think tank pan-europeu baseado no projeto "Grupo de Apoio
Intermarium", com o objetivo de desenvolver e promover as suas ideias na
Europa.
O Intermarium: Renovando a base ideológica do
Nacionalismo Ucraniano
As publicações de Semenyaka contêm referências intelectuais
alheias às tradicionais referências centradas na nação, como as que se
encontram em Stepan Bandera. Na verdade, são bastante inovadoras, para dizer o
mínimo, dentro da ideologia e cultura nacionalistas ucranianas. As suas
referências incluem figuras alemãs como Friedrich Nietzsche, Martin Heidegger, Carl Schmitt e Armin Mohler, bem como da esfera intelectual da
Nova Direita Francesa. Exemplos incluem Dominique Venner, ex-OAS (grupo paramilitar da
Organização do Exército Secreto Francês) e membro fundador do grupo "Ação
Europa"; Alain de
Benoist, fundador da Nova Direita Francesa (Nouvelle Droite); o escritor
colaboracionista Pierre
Drieu de la Rochelle; e o filósofo religioso René Guénon. Considerado um dos pais da
filosofia tradicionalista e do fascismo, o autor italiano Julius Evola também é
utilizado na filosofia de Semenyaka, colocando-a na genealogia tradicionalista.
A ideia de uma tradição primordial como denominador comum das sociedades e
espiritualidades humanas tem sido utilizada pelos movimentos fascistas
históricos, bem como pelos grupos de direita contemporâneos (Segwick, 2019).
Faz também referência ao pensamento nacionalista integralista de Charles Maurras, fundador do movimento monárquico francês Action Française em 1899. No entanto, é à Revolução Conservadora Alemã que deve a maior parte da sua inspiração na sua busca de uma nova "metafísica ocidental", uma mundividência filosófica que procura estabelecer, como Nietzsche e Heidegger sugeriram, uma ordem simbólica capaz de responder à crise de significado enfrentada pelas sociedades europeias contemporâneas. Este propósito está associado a uma Terceira Via geopolítica e a uma perspetiva pan-europeia, como explicou Semenyaka no seu artigo de 2019, “A Revolução Conservadora e o Anarquismo de Direita”:
“A Revolução Conservadora é também algo como a reavaliação
de todos os valores. É uma abordagem revolucionária. Não é reacionária e não é
conservadora, apesar do título. Caminha para uma nova ordem mundial, novos
valores e uma nova metafísica do Ocidente.”
De acordo com Semenyaka, com base numa leitura evoliana da
história extraída de Fascismo de direita (1964), que analisa as
doutrinas fascistas e nazis e os seus fracassos de forma tradicional e
contrarrevolucionária, a revolução nacional na Europa tem estado atolada num
interregno liberal que tem impedido a sua ascensão ao poder. De qualquer modo,
ela acredita que a revolução acabará por eclodir, conduzindo a uma renovação
espiritual e nacional na Europa, desde que o nacionalismo contemporâneo
redefina os seus paradigmas em consonância com as diretrizes introduzidas por
Ernst Jünger no seu ensaio "O trabalhador: dominação e figura"
(1989):
"O nacionalismo não quer aceitar a dominação das
massas, mas requer a dominação do indivíduo, cuja superioridade é criada pelo
conteúdo interior e pela energia viva. Não quer igualdade, nem justiça
excluída, nem liberdade, que se reduz a exigências vazias. Quer deleitar-se com
a felicidade, e felicidade é ser si mesmo e não os outros. O nacionalismo
moderno não quer pairar no espaço sem ar das teorias, não procura o "livre
pensamento", mas sim conquistar laços fortes, a ordem, enraizar-se na
sociedade, no sangue e no solo. Não quer o socialismo da oportunidade, quer o
socialismo do dever, do mundo rígido e estoico a que o indivíduo se deve
sacrificar."
Na perspetiva pós-modernista de Semenyaka, o fim da Guerra
Fria e o surgimento, em parte dentro da ideia de Fukuyama de "fim da
história", de um novo mundo liberal e globalizado desafiaram a geopolítica
convencional e os processos históricos cíclicos. A crise atual desta nova ordem
mundial é, na visão de Semenyaka, a confirmação de um desejo de regresso da
nação à escala europeia, mas sem descurar os benefícios técnicos da
modernidade. Ao contrário da maioria dos movimentos nacionalistas europeus que
se têm agarrado ao chauvinismo e ao presentismo, Semenyaka defende uma
estratégia metapolítica a longo prazo para a tomada do poder.
Com base nesta visão "prometéica" da geopolítica,
Semenyaka pretende lançar as bases para um novo plano continental onde as
nações da Europa de Leste seriam o epicentro de uma integração europeia
alternativa: o Intermarium. Este
bloco geopolítico, abrangendo a configuração geográfica da antiga
Rzeczpospolita polaca, estendendo-se do Báltico até às margens do Mar Negro,
seria tanto uma barreira defensiva para a Europa de Leste contra a Rússia como
a matriz de uma Nova Europa em que a restauração dos valores do passado seria
conciliada com os valores tecnológicos do futuro.
O projeto Intermarium convoca os vários grupos nacionalistas
da região a unirem-se sob a bandeira de um único ideal civilizacional, tal como
idealizado por Semenyaka em colaboração com Andriy Voloshyn, fundador do Clube
Tradicionalista Ucraniano e da Associação Arqueofuturista Ucraniana
(Ukrayins’ka arkheo futurystychna asotsiatsiya, ARFA), uma organização
estudantil que promove a modernização do nacionalismo ucraniano e a sua
reorientação geopolítica para uma identidade metarregional. Segundo Semenyaka,
as nações do Intermarium estão na interface de dois mundos: o Ocidente e o
Oriente. Esta posição é a manifestação de um equilíbrio moral entre os extremos
do “fundamentalismo oriental” e do “progressismo ocidental”, fonte de uma
linhagem oriental original e de uma comunidade regional.
Semenyaka considera explicitamente o projeto Intermarium
como uma “terceira via” política e geopolítica para a Europa, tanto do ponto de
vista geográfico como ideológico. Com base numa abordagem histórica específica
do legado panslavo do antecessor do Azov, o grupo paramilitar jarquiano chamado
Patriota da Ucrânia (Patriot Ukraïny), Semenyaka sustenta que o
Intermarium assenta no equilíbrio entre os componentes de um eixo Norte-Sul;
esta dicotomia cultural corresponderia ao binário Este-Oeste, com a Ucrânia a
funcionar como síntese dos dois.
O seu argumento apoia-se na antiga colonização da costa do
Mar Negro pelos gregos, que introduziram os fundamentos da civilização
ocidental, e particularmente os seus princípios democráticos, a partir do Sul.
Ao mesmo tempo, considera-se que o Norte está intimamente ligado às migrações
dos povos germânicos do norte da Europa, os godos, para a região no século III
d.C. Esta polarização Norte-Sul foi também o eixo escolhido pelos príncipes da
Rús de Kiev, uma força europeizante, para expandirem o seu domínio para o Norte
“bárbaro” até Nóvgorod.
Para Semenyaka, o objetivo do Intermarium é, portanto,
promover um movimento unitário capaz de integrar estes legados contraditórios e
avançar numa nova integração Norte-Sul (em vez da histórica Este-Oeste) para a
Europa de Leste. Este é o significado geral da sua iniciativa, que se baseia na
história antiga mais do que nas recentes confrontações geopolíticas.
Ela também recorre à noção de “prometeísmo”, utilizada por
Józef Piłsudski no início da década de 1920 para teorizar a restauração da
Polónia como uma reencarnação moderna do antigo domínio polaco, unificando o
reino Báltico-Mar Negro num esforço comum contra o comunismo.
Neste sentido, Semenyaka adota as teorias "Chornomorskyi"
(do Mar Negro) da escola geopolítica ucraniana, desenvolvidas por Yurii Lypa na
sua Trilogia Ucraniana, ou por Stanislav Dnistrianskyi (Wilson, 2015).
Esta abordagem reconsidera o "destino manifesto" da Ucrânia através
dos seus substratos geográficos e históricos, e destaca a geografia como um vetor-chave
de identidade. Inspira-se em Dmytro Dontsov, para quem a Europa de Leste era
uma barreira natural contra aquilo a que chamou a "mutação cultural mongol
da Rússia" (Ostriitchouk, 2013). Os seus proponentes veem na União
Soviética uma versão asiática do poder.
Inspirado pelas teorias de Lev Gumilev sobre a etnicidade,
Semenyaka acredita que os grupos étnicos são organismos biossociais que podem
ser mutuamente simbióticos ou exclusivos. Ela defende um “etnofuturismo” em que
as divisões nacionais existentes na região do Báltico e do Mar Negro sejam
ultrapassadas por sinergias etnorregionais mais vastas. Ao enfatizar a
cooperação em vez da competição entre os povos do Intermarium, o etnofuturismo
procura evitar a armadilha do isolamento geopolítico imposto à Europa de Leste:
uma vez unificada, a região lideraria uma “quarta revolução industrial”,
combinando as tradições europeias e as novas tecnologias. Este etnofuturismo é,
na verdade, um empréstimo direto do pensador francês da Nova Direita, Guillaume Faye. Na sua obra Arqueofuturismo
(1998), Faye defende que o destino da civilização europeia deve passar pelo
regresso das sociedades a valores arcaicos sem demonizar a tecnologia, e que
isso deve coincidir com a formação de um grande bloco estatal pan-europeu
independente denominado “Euro-Sibéria”.
Por fim, Semenyaka vê o projeto do Intermarium como uma
rampa de lançamento para uma revolução pan-europeia. A escolha de uma palavra
latina terminada em -ium evoca o "Imperium", que se refere ao poder
militar romano e, em certa medida, à ideia de grandeza. Ao contrário de intra-,
inter- evoca a noção de espaços amplos e descontínuos dentro de um único bloco,
o que poderia ser considerado um paralelo ao espaço Intra-Báltico. Tal como
outros nacionalistas da Europa de Leste, Semenyaka sonha revitalizar um nacionalismo
da Europa Ocidental em declínio e esgotado através de um novo e renovador
nacionalismo da Europa de Leste: "A diferença entre nações 'antigas' e
'jovens' (ou tardias) explica porque é que a união Intermarium desempenha o
papel de plataforma para a Reconquista Pan-Europeia, ou o laboratório do
renascimento pan-europeu" (Semenyaka, s.d.).
Esta revolução pan-europeia permanece amplamente inspirada
por várias teorias fascistas clássicas de regeneração através da necessidade de
uma guerra cultural, de uma vanguarda ideológica esclarecida e da existência de
um mundo oculto. Semenyaka, por exemplo, não
esconde a sua atração pelo estilo musical do black metal. Teoriza-o
como um género musical reservado a uma elite privilegiada que acredita nos
princípios cavalheirescos, uma espécie de vanguarda conservadora supranacional
capaz de fazer renascer uma certa ideia de Europa baseada na rejeição da
decadência moderna. Em 2012, ela publicou o capítulo "Quando os deuses ouvem
o chamado: o potencial conservador-revolucionário da arte black metal"
em Black Metal: Raízes Europeias e Extremidades Musicais, publicado pela
Black Front Press, sob a direção do ativista nacional-anarquista britânico Troy
Southgate.
Semenyaka analisa a filosofia herética do Black Metal
através do conceito de “luciferianismo ariano” (Semenyaka, 2016), inspirado
pelas referências à Ariosofia, ao niilismo de Ernst Jünger e ao “espírito
aristocrático” de Julius Evola. Ela vê este “luciferianismo ariano” como um
apelo a uma forma extrema de romantismo, poder e violência marcada por
princípios e simbolismos neopagãos, ainda que prefira referir-se ao gnosticismo
como princípio filosófico para esta interpretação metafísica do Black Metal
(Semenyaka, s.d.). Tomando o satanismo como uma norma elitista, o conceito de “luciferianismo
ariano” no Black Metal pode ser detetado na filosofia de Semenyaka como um
sentimento metafísico da unidade entre liberdade e necessidade, pressuposto em
detalhe e precisão pelo conceito de voluntariado étnico europeu. Isto faz eco
da ideia do italiano Julius Evola, um "tradicionalista radical", um
revolucionário conservador e um crítico do fascismo de "direita", que
enfatiza, com algumas noções da cultura esotérica nazista, que a nobreza do
espírito e a nobreza tradicional da Europa se combinam em uma única empresa
messiânica.
As redes do novo "voluntariado europeu"
Enquanto secretária de imprensa e, mais tarde, secretária
para as relações internacionais do movimento Azov, Semenyaka construiu uma
extensa rede de contactos com diversos indivíduos e grupos intelectuais de
extrema-direita, nacionais e internacionais.
Desde o seu envolvimento com o Clube Tradicionalista
Ucraniano, Semenyaka tem-se interessado em estabelecer contacto com membros de
movimentos nacionalistas ucranianos, incluindo o Centro Monárquico de Kiev, de
Eduard Yurchenko, para o qual discursou na Segunda Conferência Monárquica
Ucraniana em 2013. Após ter ingressado no Setor Direito, Semenyaka cooperou com
a União Ucraniana Svoboda, através do conselheiro parlamentar Yury Noevy, e com
o grupo de milícias C14, ambos ativos durante a Revolução Maidán. Apesar da
heterogeneidade que possa existir entre estes grupos, o papel de Semenyaka como
secretária de imprensa do movimento Azov permitiu-lhe interagir com outros
movimentos, como o ultraortodoxo Katekhon, que apoia o estabelecimento de uma
sociedade religiosa e conservadora ucraniana contra a influência da Ortodoxia
Russa e dos valores liberais ocidentais, bem como com o supremacista
autonomista Karpatska Sich, sediado na região Transcarpática de Uzhhorod.
Paralelamente aos seus contactos com vários movimentos
ucranianos, Olena Semenyaka estabeleceu relações com vários movimentos
internacionais. Esta estratégia corresponde, antes de mais, ao desejo de
encontrar apoiantes internacionais com o objetivo claro de contrariar a
narrativa pró-Rússia sobre o conflito ucraniano e o apoio que Moscovo tem
obtido dos principais partidos europeus de extrema-direita (Fromm, 2017). Para
responder aos sucessos da Rússia na aproximação à extrema-direita europeia,
Semenyaka tem vindo a desenvolver a sua própria gama de contactos. Antes da
criação do Grupo de Apoio Intermarium, reuniu-se pela primeira vez com os
líderes do jornal conspirativo sueco Nya Tider em 2014 para uma
entrevista. O jornal está ligado ao movimento Nordisk Ungdom, próximo da Frente
Norte Escandinava, que apoiou financeiramente o Sector Direito no auge do
conflito de Maidán. Participou também na receção ao voluntário Mikael Skilt,
agora um conservador moderado, do extinto neonazi Svenskarnas Parti; um comité
dos Democratas Suecos (Sverigedemokraterna); e membros da organização
voluntária Svenska Ukrainafrivilliga (Semenyaka, 2014).
Como vimos, o Intermarium é o projeto central de longo prazo
de Semenyaka. Para construir esta união, é evidente que ele precisa de unir os
nacionalistas da Europa de Leste e incorporá-los gradualmente numa genuína
missão ideológica para alcançar a unidade europeia. É este o objetivo da
"Reconquista", cujo nome é por si só suficiente para demonstrar a sua
natureza ofensiva, prática e ideológica. É o instrumento que deve garantir a
realização final do Intermarium. A Reconquista é um ato fundador de um
movimento de união das forças nacionalistas em torno de Azov, Semenyaka e do
seu projeto Intermarium, e de disseminar o pensamento nacionalista por toda a
Europa. Enquanto instrumento para reconquistar terreno, a Reconquista
desempenha também um papel mediador na resolução das inúmeras disputas
comemorativas e ideológicas entre os vários atores dos movimentos nacionalistas
europeus e, consequentemente, na união destes atores. O projeto Reconquista é
político, mas também cultural: é, em consonância com o pensamento de Semenyaka,
um grande impulso para a estratégia internacional de Azov, com um slogan
ambicioso e assertivo que resume todas as suas esperanças: "Hoje Ucrânia,
amanhã Rússia e toda a Europa!"
Assim, o projeto Reconquista, revelado em outubro de 2015, tornar-se-á o eixo central, mas não o único, da maior parte da comunicação de Azov e da extrema-direita na internet e nas redes associadas. Assume a forma de um blog na plataforma Tumblr. O blogue é relativamente ativo, com cerca de seis a nove publicações por semana.
Reconquista é concebido como uma plataforma de reflexão
metapolítica, com o objetivo de unir as forças dos nacionalistas europeus:
"A Reconquista é um aspeto central da nossa comunicação com outras forças
nacionalistas na Europa. Ao divulgar as nossas notícias, deixamos claro que
Azov tem os mesmos objetivos que eles têm para a Europa. Isto permite-nos
estabelecer laços com outras forças conservadoras."
Para além do blogue, Semenyaka organizou várias conferências
"Pan-Europa" em Kiev. A 28 de abril de 2017 e a 15 de outubro de
2018, após as conferências anuais do "Grupo de Apoio Intermarium" do
movimento Azov, o grupo recebeu vários ativistas de extrema-direita, divididos
em secções "parlamentar" e "metapolítica". Alguns exemplos
incluem:
- O ativista italiano Sébastien Manificat e Alberto
Palladino, orador internacional da CasaPound Itália;
- Os alemães Remo Kudwien ("Matz") e Maik Schmidt,
da organização juvenil NPD, bem como Julian Bender e vários membros do partido
"revolucionário, nacionalista e socialista" Der III. Weg, um aliado
de longa data do movimento Azov que, até à data, participou em cerimónias em
memória dos soldados ucranianos no dia 14 de outubro de cada ano;
- Ativistas do Grupo de Defesa da União Identitária Francesa
(GUD), sediado em Lyon, incluindo Steven Bissuel e Pascal Lassalle, da Nova
Direita, que defendem a Ucrânia contra as visões pró-Rússia da extrema-direita
francesa;
- O YouTuber e culturista sueco Marcus Follin ("O
Dourado"), que promove um "estilo de vida de direita" online;
- O norueguês Bjørn Christian Rødal, do partido eurocético e
nacionalista nórdico Alliansen – Alternativa para a Noruega;
- O supremacista branco e filósofo nacionalista
norte-americano Greg Johnson, cujo site Counter-Currents foi traduzido e
publicado nas principais publicações inglesas de Semenyaka;
- Os activistas polacos Pawel Bielawski e Witold
Dobrowolski, respetivamente da revista polaca SZTURM e da revista
metapolítica Niklot; e
- Mindaugas Sidaravičius, da União Nacionalista Lituana.
Ao reunir simpatizantes pró-ucranianos e aliados potenciais,
apesar dos seus vínculos com a Rússia, estas reuniões tiveram como objetivo
estabelecer um fórum de diálogo e reflexão para promover a ideia de uma
revolução nacionalista pan-europeia e forjar novos laços pessoais e
institucionais.
No mesmo período, a partir de 2017, Semenyaka começou a
viajar para o estrangeiro com uma frequência crescente, estabelecendo vínculos
particularmente importantes na Alemanha, onde concedeu uma entrevista ao jornal
Deutsche Stimme e participou, a 22 de março de 2015, no congresso
europeu de nacionalistas, por convite da ala juvenil do partido de
extrema-direita Partido Nacional Democrático (NPD) (Speit, 2014).
Esta experiência, que evidenciou a afinidade genuína de
Semenyaka com a filosofia revolucionária alemã, repetiu-se nos dias 11 e 12 de
maio de 2018, na conferência “[RE]generação. Europa”, organizada em Riesa. A
conferência “[RE]generação. Europa” reuniu vários grupos europeus de
extrema-direita, que vão desde os franquistas anti-imigração espanhóis Hogar
Social Madrid até ao movimento polaco da Terceira Via, Trzecia Droga.
O evento ficou marcado pela presença do nacionalista croata
de extrema-direita Tomislav Sunić, um dos atores-chave da reunião, acompanhado pelo
membro do Parlamento Europeu Ruža Tomašić e pelo ex-legionário estrangeiro
francês Bruno Zorica, com o objetivo de abrir a Croácia ao projeto Intermarium
de Semenyaka.
A 14 de maio de 2018, Semenyaka visitou a Alemanha Central
para a conferência “Phalanx Zentropa II”, organizada pela secção pró-ucraniana
do Die Rechte, e a 7 de julho de 2018, participou no festival “Juventude na
Tempestade”, organizado pela Der III. Weg. Longe de se concentrar apenas nos
contactos com ativistas do mundo germânico, Semenyaka também expandiu
gradualmente a sua influência em diversos círculos metapolíticos. Durante
palestras e “noites ucranianas” sobre geopolítica, ela discutiu as suas visões
sobre a história ucraniana e a estratégia de Azov com grupos como o Flamberg
Club (15 de junho de 2018), em Halle, e a editora Jungeuropa Verlag, de
Dresden, e a Young Europe (3 e 5 de agosto de 2018).
Ao mesmo tempo, ela também expandiu os seus contactos na Europa Ocidental, estreitando laços com a italiana CasaPound, que se autointitula "fascismo do século XXI". Visitou Itália em janeiro de 2019 para participar na marcha anual Acca Larentia, em comemoração do aniversário do assassinato de três membros da Frente Juvenil do Movimento Social Italiano, a 7 de janeiro de 1978, acompanhada por uma delegação de Karpatska Sich e do ativista ucraniano da CasaPound, Yaroslav Zakalyk. Por fim, participou no "Fórum Prisma Atual", em Lisboa, a 4 de maio de 2019, a convite do grupo identitário português Escudo Identitário. Esta última visita foi uma oportunidade para se apresentar ao público ibérico como representante de uma nova "Reconquista" na Ucrânia.
Semenyaka nunca deixa de fortalecer as sinergias Norte-Sul
que sustentam o seu projeto Intermarium. Participa em reuniões e conferências
organizadas por apoiantes do etnofuturismo, como o grupo metapolítico
nacionalista branco estónio Sinine Äratus (Despertar Azul) e, atualmente, o
deputado do partido Eesti Konservatiivne Rahvaerakond (EKRE) Ruuben Kaalep.
Também participou, em 24 de fevereiro de 2019, na celebração da independência
da Estónia, juntamente com ativistas nacionalistas do EKRE. Mais do que simplesmente
apoiar um partido que critica tanto a União Europeia como a Rússia, este
desfile demonstrou que o espaço Intermarium pode ser estabelecido com base numa
memória comum: nomeadamente, a luta pela independência da União Soviética.
Paralelamente a estes acontecimentos, Semenyaka conheceu o
neopagão faroense Fróði Midjord, que a convidou para palestrar no fórum
identitário nórdico Scandza a 30 de março de 2019, cujo objetivo era destacar o
conceito de anarcotirania. Na presença de figuras da alt-right
americana, como Jared Taylor, editor-chefe da revista nacionalista branca American
Renaissance, e do autor antissemita Kevin MacDonald, que visitava a região
pela primeira vez, Semenyaka promoveu as teorias de Ernst Jünger sobre o estado
policial neototalitário e insistiu na necessidade de alavancar as modernas
tecnologias mediáticas para apoiar um projeto pan-europeu.
Após este encontro nórdico, concedeu uma entrevista ao
podcast "Anton och Jonas", apresentado por Anton Stigermark,
representante do partido Alternativa para a Suécia, e Jonas Nilsson, antigo
instrutor do Batalhão Azov para voluntários suecos e coordenador do "Projeto
Boer", um grupo nacionalista branco sul-africano, que presta apoio
político e mediático à minoria africânder. Semenyaka concluiu as suas viagens
nórdicas a 6 de abril de 2019, na conferência Awakening II em Turku, Finlândia,
onde lançou as bases para a futura cooperação finlandesa-ucraniana, com base no
legado da parceria entre a Finlândia (sob o comando de Herman Gummerus) e a
Ucrânia (sob o comando de Pavló Skoropadski) em 1918.
Longe de limitar os seus laços à cena metapolítica internacional, Semenyaka tem também muitos contactos na esfera artística do Black Metal. Desde 2015 que é próxima dos neopagãos e nazis esotéricos dos Wotan Jugend, liderados pelo russo Alexey Levkin, vocalista da banda de Black Metal Militant M8L8TH (Semenyaka, 2019b).
“Storm Over
Azov” - M8L8TH
Desempenhando um papel ativo na organização do festival de
Black Metal “Asgardsrei” e da “Conferência Pact of Steel”, forjou laços com
vários grupos, como o grupo alemão Absurd, o francês Peste Noire (Semenyaka,
2017) e o finlandês Goatmoon. Mantém também relações com o russo Ivan Mikheev,
um discípulo do padre ecofascista neopagão Alexey “Dobroslav” Dobrovolsky, que
cofundou o movimento tradicionalista russo exilado Russkii Tsentr (Centro
Russo). No entanto, em 2019, Mikheev deixou o Centro Russo devido a crescentes
divergências com a agenda do Wotan Jugend, resultantes da filiação de Alexey
Levkin. Ao contrário de Semenyaka, que se dedica à criação de uma Nova Direita
na Ucrânia, as iniciativas de Levkin foram excessivamente provocatórias. Ao
associar-se a grupos neonazis notórios, como o Rise Above Movement (RAM), um
violento grupo supremacista branco americano (Colborne, 2019), ou ao organizar
eventos como a comemoração do aniversário de Hitler, chamada
"Führernacht", com o seu gangue paralelo "Akvlt"
(Bellingcat, 2019), deu má fama às ambições de Semenyaka.
Da mesma forma, em 2019, durante o festival anual de
Asgardsrei, Semenyaka discursou na série de palestras "Pacto de Aço"
ao lado de Sergiy Zaikovsky, académico de Estudos Indo-Europeus da Plomin,
editor, tradutor e investigador da Nova Direita. Uma nova série de palestras,
intitulada "Pátria", alude à terra natal primordial dos povos
indo-europeus, a estepe pôntico-cáspia, parcialmente ocupada pelo sul da
Ucrânia moderna (uma hipótese mais provável do que a península indiana e a hipótese
da migração ariana associada).
Por fim, desde o início de 2019, Semenyaka é ativista da
organização "feminista alternativa" "Rosas de Prata",
fundada por Julia Fedosiouk, membro do Plomin (Kovalenko, 2020). Longe de adotar
a imagem frequentemente defendida pela extrema-direita ucraniana, "Rosas
de Prata" propõe uma ideologia feminista que procura revalorizar o
estatuto da mulher no seio dos movimentos nacionalistas ucranianos e combater
os alegados excessos do feminismo contemporâneo. Olena Semenyaka participa à
distância na elaboração da sua doutrina do “atenismo” (em referência à deusa
grega Atena, mãe da sabedoria, da arte e da guerra), uma conceção inspirada na
Nova Direita da feminilidade europeia e no estatuto da mulher enraizado na
experiência dos séculos XIX e XX (Kovalenko, 2020).
Conclusão
Ambiciosa e inovadora no seu pensamento, Olena Semenyaka
personifica hoje esta nova geração de pensadores nacionalistas ucranianos cujo objetivo
é distanciar a herança doutrinária do nacionalismo ucraniano de temas
ultrapassados. Esta nova frente ideológica partilhada, inspirada no legado da
Revolução Conservadora Alemã e da Nova Direita Francesa, pode agora construir
uma linguagem comum com outros movimentos nacionalistas na Europa. Uma das
principais missões de Semenyaka é, de facto, tornar a Ucrânia, outrora
periférica e à margem do debate ideológico europeu, um novo ponto de
convergência para toda a Europa e a vanguarda do vindouro Intermarium. Nesta
estratégia, a luta contra a Rússia constitui apenas uma componente entre muitas
outras, e não a mais importante: a sua abordagem inovadora descolonizou
profundamente o nacionalismo ucraniano da sua obsessão pela Rússia, criando um
novo grupo ideológico partilhado com outros grupos nacionalistas europeus
radicais em torno das ideias de unidade continental, cuja componente racial é
claramente expressa. Através das suas interações sem precedentes, Semenyaka
permitiu ao movimento Azov consolidar e diversificar o seu aparelho ideológico,
mas também fortalecer a sua influência no estrangeiro — uma mutação ideológica
a uma escala rara, observada pela primeira vez na história da extrema-direita
ucraniana.
Fonte: MRNS, 17 de março de 2022
(a) O Intermarium (em polaco Międzymorze,
“Entre-Mares”) é um conceito geopolítico formulado no início do século XX por
Józef Piłsudski, líder militar e político polaco. A proposta consistia na
criação de uma confederação de Estados da Europa Central e de Leste, situada
entre o Mar Báltico, o Mar Negro e, em algumas versões, até o Mar Adriático.
O objetivo fundamental era formar um bloco regional
independente das grandes potências vizinhas – a Alemanha, a ocidente, e a
Rússia (depois União Soviética), a oriente. Esta confederação reuniria nações
historicamente ameaçadas por esses impérios, como a Polónia, a Lituânia, a
Ucrânia, a Hungria, a Roménia ou a Checoslováquia, funcionando como uma
“terceira via” geopolítica na Europa, distinta tanto do Ocidente como do
domínio russo.
Na prática, o projeto de Piłsudski nunca se concretizou. As
tensões internas, as divergências nacionais e os interesses contraditórios
entre os diferentes países inviabilizaram qualquer forma de união duradoura.
Ainda assim, a ideia permaneceu como mito político e, em determinados momentos,
foi reavivada ao longo do século XX, inclusive no contexto da Guerra Fria.
Nos últimos anos, o conceito do Intermarium tem sido recuperado por correntes nacionalistas na Europa de Leste, em especial pelo movimento Azov na Ucrânia. Para estes grupos, trata-se de uma forma de imaginar uma aliança regional de Estados soberanistas contra a Rússia, mas também, em certas versões, como contrapoder à União Europeia. O mito histórico é, assim, reutilizado como inspiração para novos projetos políticos e identitários, combinando heranças antigas com objetivos contemporâneos.
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