Portugal acaba de pagar 1,5 mil milhões de euros do resgate europeu e assim falta saldar 95%

Os dois grandes credores europeus estão a cobrar, em termos médios e com todas as comissões incluídas, entre 1,6% e 2,2% de taxa de juro. Pode ser barato, pois, por comparação, as emissões de dívida feitas em 2023 resultaram numa taxa de 3,5% para a República.

A redução da dívida pública portuguesa tem sido custosa e vai continuar a ser um longo e duro caminho que os contribuintes terão de percorrer durante as próximas décadas com vista a cumprir o Pacto de Estabilidade, já que a dívida total equivale a mais de 100% do Produto Interno Bruto (PIB), quando devia ser 60% ou menos.

No final de novembro, quase dez anos após o final oficial do programa de ajustamento da troika, o Estado (o IGCP, a agência que gere a dívida pública portuguesa, tutela do Ministério das Finanças) amortizou mais 1,5 mil milhões de euros do que falta da parte do enorme resgate concedido pelos credores europeus para evitar a bancarrota do país em 2011.

A este acrescia a parte do Fundo Monetário Internacional (FMI) que, por ser demasiado caro, foi saldado muito mais cedo, em 2018.

O Tesouro reembolsou os referidos 1,5 mil milhões de euros à Facilidade Europeia de Estabilidade Financeira (que hoje é conhecida por Mecanismo Europeu de Estabilidade, ESM na sigla inglesa), ficando assim a dever 95% do duplo empréstimo europeu (que ascendia a 50,1 mil milhões de euros).

A parte do empréstimo concedida, no âmbito do resgate e programa de ajustamento, pelo FMI, que chegou a 28 mil milhões de euros, foi totalmente amortizada em 2018 pelo governo de António Costa e pelo então ministro das Finanças, Mário Centeno, que completaram o esforço iniciado já pelo governo precedente, do PSD-CDS, de Pedro Passos Coelho. Era um crédito bastante mais caro do que o dos credores europeus.

Segundo a agência da dívida pública portuguesa (IGCP), a taxa de juro "all in cost", a taxa efetiva final, da parte do pacote de resgate que cabia ao FMI, chegou a uns impressionantes 4,9%.

Só por comparação, os credores europeus estão a cobrar ou cobraram em termos médios ponderados, todas as comissões incluídas (all in), entre 1,6% e 2,2% de juros, diz o IGCP, hoje.

Também por comparação, em 2023, todas as emissões de dívida consideradas, resultaram num custo (taxa de juro) para a República de 3,5%.

No mercado de retalho da dívida de longo prazo (obrigações a dez anos), Portugal paga atualmente (sexta-feira) uns razoáveis 2,7%, mesmo com o Banco Central Europeu (BCE) a agravar os níveis de juros da Zona Euro.

Mas o que falta pagar à Europa - ao ESM e ao Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira (MEEF) - apesar de as taxas de juro praticadas serem relativamente baixas e decentes, ainda é muito (o volume de endividamento em euros) e deixará o país sob a vigilância dos credores europeus duas décadas.

As últimas tranches de pagamento a ambas as instituições estão agendadas para 2042, de acordo com o plano hoje em vigor. Faltam cerca de 20 anos, portanto.

É sempre muito dinheiro. Em cima disto, há as novas modalidades de empréstimos que entretanto surgiram (o SURE, o pacote de apoio ao emprego criado com a pandemia), os empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e, claro, a dívida mais importante, as Obrigações do Tesouro (OT) detidas pelos grandes credores privados nacionais e internacionais (bancos e fundos de investimento) e os bancos centrais (para efeitos de política monetária).

Se centrarmos apenas a análise nos chamados empréstimos oficiais europeus (ESM e MEEF), o peso do que falta pagar representa quase um quinto da dívida pública total nacional. Falta reembolsar cerca de 48 mil milhões de euros.

(…).

Os próximos anos

Em 2024, segundo o plano oficial do IGCP, haverá uma pausa nos reembolsos aos credores europeus, mas o ciclo dos pagamentos é para retomar em 2025, com mais 1,5 mil milhões de euros ao ESM.

Em 2026 repete, com 800 milhões de euros para este mesmo fundo da Zona Euro, a que somam 2,2 mil milhões de euros para o MEEF.

E, em 2027, nova rodada pelos dois credores europeus: os contribuintes serão chamados a reembolsar mais mil milhões de euros ao ESM e dois mil milhões ao MEEF.

O Banco de Portugal recorda que "o Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) foi acordado, em maio de 2011, entre as autoridades portuguesas, a União Europeia e o FMI".

Foi quando Portugal ficou na bancarrota e sem capacidade de se endividar normalmente e a preços decentes nos mercados, tal era a desconfiança na viabilidade das contas do país e o ataque cerrado especulativo que estava a ser feito contra a dívida pública de vários Estados da Zona Euro.

"Com uma estratégia que visava o restabelecimento da confiança dos mercados financeiros internacionais e a promoção da competitividade e do crescimento económico sustentável, o PAEF assentou em três pilares: consolidação orçamental, estabilidade do sistema financeiro e transformação estrutural da economia portuguesa", explica o BdP, que integrava a troika através da figura do BCE.

Inicialmente, "o pacote de assistência financeira previa, para 2011 a 2014, um total de 78 mil milhões de euros, dos quais 52 mil milhões de euros correspondiam a financiamento através dos mecanismos europeus e 26 mil milhões de euros a assistência do FMI. Deste total, 12 mil milhões de euros foram destinados ao apoio público à solvabilidade do setor bancário".

O banco central agora governado por Centeno recorda ainda que "no âmbito do PAEF tiveram lugar 12 missões de revisão" e que "no total foram recebidos 11 desembolsos, representando cerca de 97% do montante total acordado".

"O Programa expirou a 30 de junho de 2014, sem o desembolso da última tranche."

Fonte: Jornal de Notícias, 30 de dezembro de 2023

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