Bruxelas acusa Polónia de falta de boa-fé e ameaça com ações judiciais
"A verdade é que considero a situação na fronteira
polaca com a Ucrânia absolutamente inaceitável", disse Adina
Vălean, a Comissária Europeia dos Transportes, na quarta-feira.
"Embora apoie o direito das pessoas a protestar,
toda a UE, para não falar da Ucrânia, um país atualmente em guerra, não pode
ficar refém do bloqueio das nossas fronteiras externas. É tão simples quanto
isso", afirmou.
Desde 6 de novembro, camionistas e agricultores polacos têm
bloqueado o trânsito em diferentes postos fronteiriços ao longo da fronteira
polaco-ucraniana. Na segunda-feira, as restrições permanentes foram alargadas a
um quarto posto, em Medyka, agravando ainda mais a crise.
Apenas os veículos que transportam ajuda humanitária e
militar são autorizados a entrar.
Em consequência, milhares de camionistas ucranianos ficaram
retidos e foram obrigados a esperar dias inteiros para chegar ao outro lado,
com filas de espera que se estendem por mais de 30 quilómetros até ao
território polaco. As condições difíceis no terreno, incluindo temperaturas
negativas e a falta de instalações sanitárias, suscitaram preocupações em
matéria de segurança.
Dois condutores ucranianos que esperavam para atravessar a
fronteira morreram dentro dos seus veículos, ambos alegadamente de causas
naturais.
Os manifestantes polacos exigem a reintrodução das regras
anteriores à guerra para os camionistas ucranianos, que foram isentos da
obrigação de possuir licenças de transporte. A mudança foi introduzida no ano
passado como parte das "faixas de solidariedade" da União Europeia,
que se destinam a ajudar a nação devastada pela guerra a manter a sua economia
nacional e as suas relações comerciais.
Os manifestantes também querem que os camiões vazios que
regressam da Ucrânia para a UE sejam excluídos de um sistema eletrónico de
filas de espera criado por Kiev e que sejam introduzidas medidas para impedir
que os transportadores bielorrussos e russos fujam às sanções internacionais.
Polónia defende-se
Segundo o Ministério das Infraestruturas polaco, as
alterações introduzidas pelas "faixas de solidariedade" alteraram
drasticamente a concorrência em detrimento dos motoristas polacos: em 2021, um
ano antes de a Rússia lançar a guerra, os camionistas polacos tinham uma
quota de mercado de 38% contra 62% dos seus concorrentes ucranianos, que
oferecem tarifas mais baratas e não estão vinculados às normas da UE. No final
de outubro, os números passaram para 8% e 92%, respetivamente.
Mas, ao contrário das proibições impostas no início deste
ano aos cereais ucranianos isentos de direitos aduaneiros, estas restrições
fronteiriças não são estabelecidas nem apoiadas pelo governo polaco de
extrema-direita, que perdeu o poder após as eleições de outubro.
"Mantemo-nos em contacto permanente com a indústria dos
transportes. Estamos também a falar com o governo da Ucrânia e com a Comissão
Europeia porque eles têm a chave para eliminar as causas diretas deste
protesto", disse Alvin Gajadhur, ministro interino das Infraestruturas da
Polónia, na quarta-feira.
A comissária Vălean, no entanto, não se mostrou convencida
com a abertura e repreendeu publicamente o governo polaco por não fazer a sua
parte para resolver a disputa.
"Não há boa-fé para encontrar uma solução. É esta a
minha avaliação hoje", disse Vălean. "Há uma quase total falta de
envolvimento das autoridades polacas. Digo isto porque as autoridades polacas
são as que devem fazer cumprir a lei naquela fronteira", acrescentou.
A comissária afirmou que existe uma lista de
"medidas técnicas" que podem aliviar as tensões e restabelecer o
trânsito, mas que "têm de ser aceites pela parte polaca".
"Continuamos o diálogo, mas reservamo-nos o direito de
intervir como Comissão, mesmo com um processo por infração, contra aqueles que
não respeitam as regras e não aplicam a lei", disse Vălean.
Um processo por infração é um dos instrumentos de que o
executivo dispõe para garantir que a legislação europeia é aplicada de forma
adequada e uniforme em todo o bloco. O processo tem várias fases e pode levar a
uma ação judicial no Tribunal de Justiça Europeu, que pode impor multas diárias
a um Estado-membro que não cumpra a legislação.
A Ucrânia está disposta a chegar a um compromisso com a
Polónia, mas afirma que os seus condutores têm de receber primeiro alimentos e
serviços de emergência. A Ucrânia também abriu a porta à evacuação das
pessoas que ficaram retidas na Polónia.
Entretanto, os camionistas eslovacos ameaçaram aderir ao bloqueio a partir
de 1 de dezembro, a menos que sejam tomadas medidas para diminuir a
concorrência dos transportadores ucranianos, segundo a União dos
Transportadores Eslovacos (UNAS).
Fonte: Euronews, 29 de novembro de 2023
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